quarta-feira, 2 de abril de 2014

Dicas para um apocalipse zumbi medieval

 
A pergunta que motivou esse post surgiu nas minhas divagações no busão: Como seria um apocalipse zumbi na idade média? Pouca coisa já foi produzida com essa temática nas diferentes mídias. Refletindo sobre, não é difícil perceber que o gênero é muito mais facilmente ambientado no mundo contemporâneo ou futurista, por vários fatores:

Tecnologia: a grande maioria das historias trata os zumbis como originados por uma epidemia, possivelmente algum vírus ou bactéria. Mesmo em cenários onde a origem das criaturas não é explicada, a forma de contagio por toque ou ferimentos nos leva a essa conclusão. Como é improvável que a mãe natureza criasse uma catástrofe ecológica na forma de mamíferos putrefatos comedores de cérebro, as explicações para o fenômeno giram em torno de experiências mal sucedidas, armas biológicas fora de controle ou ate mesmo uma praga alienígena vinda do espaço sideral escondida me uma nave exploratória. Isso tudo pressupõe o uso da ciência de vanguarda do século XXI.

Volume populacional: em um mundo de bilhões de pessoas e cidades com milhões de habitantes, não só a propagação de uma epidemia é muito mais rápida como o numero de zumbis gerados e seu poder destrutivo será assombrosamente maior.
Interação entre diferentes regiões: em uma época de transporte mundial ultra rápido, onde uma viagem entre lados opostos do planeta pode durar menos de um dia, existe o potencial para que vários surtos de zumbificação distantes milhares de quilômetros tenham como origem a mesma pessoa. Em uma sociedade feudal, vizinhos poderiam passar semanas sem contato e reinos relativamente próximos serem ligados por raros barcos mercantes e vagarosas caravanas.
Lugares escassamente habitados: terras ocupadas por moradores são muito mais comuns hoje em dia do que há mil anos. Sair das cidades e povoados e se esconder nos montes ou nas florestas era algo comum para vilas medievais em ataque, e locais jamais pisados pelo homem não eram difíceis de imaginar. Em caso de um apocalipse zumbi atual que tomasse o estado de São Paulo, uma pessoa sem um veiculo precisaria andar semanas antes de poder se dizer relativamente segura para dormir ao relento. E teria grande probabilidade de ser atacada durante o sono.

Ceticismo: Historias sobre mortos que andam seriam levadas muito mais a sério em um mundo medieval do que se espalhadas hoje em dia. O apego à religião e a superstições fariam toda uma comunidade se trancar em casa para se proteger dos demônios comedores de gente, enquanto hoje uma noticia dessas seria repetida por blogs nerds, teria parodia no Youtube e viraria episodio de algum programa estilo “mito ou realidade”. Essa descrença anularia, em parte, a imensa vantagem da comunicação de agora. Quando todos percebessem que não era pegadinha, seria tarde demais. 

Dependência do trabalho alheio: um fazendeiro inglês do ano 800 construía a própria casa, fabricava a própria roupa e plantava a própria comida. Grande parte das pessoas atualmente ficaria maluca sem um micro-ondas e não saberia dizer do que o tênis que calça é feito. Uma sociedade com um regime de trabalho imensamente especializado como o nosso é muito mais fácil de colapsar com a perda de operários especializados e paralização da demanda de produção e serviços, sobretudo se o motivo da greve dos engenheiros for o fato deles estarem nas ruas grunhindo e canibalizando geral.

Uma das coisas legais do RPG é poder criar qualquer coisa maluca que passe pela sua cabeça, sem precisar se preocupar com porquês. Mas eu gosto de explicar. Claro que em mundos fantásticos, onde a magia é uma força atuante, mil e um motivos e maneiras podem ser gerados para justificar uma campanha de sobrevivência estilo The Walking Dead, mas com cavaleiros de armadura. Como acredito que quanto mais coerente o cenário melhores histórias podem ser contadas, aqui estão algumas dicas para ajudar o mestre em seu trabalho, caso se decida por tentar extinguir as raças do seu mundo medieval em uma campanha com uma pegada “a civilização ruiu e nenhum lugar é seguro”. Vamos a elas:

Use Cidades: provavelmente serão de longe as áreas com maior concentração populacional do mundo. Fazer com que continentes inteiros sejam tomados pode ser menos efetivo do que zumbificar uma grande metrópole e obrigar os jogadores a fugir dela ou, pior, sobreviver por um tempo indeterminado dentro desse inferno.  



Espaço reduzido: em um apocalipse zumbi, quanto mais apertado melhor. Cidades são cheias de construções, becos, esgotos, tetos, paredes, enfim, uma infinidade de esconderijos de onde um zumbi pode sair de repente e atacar alguém, e onde pessoas podem se perder, ser encurraladas e pegas desprevenidas.

Ninguém entra, ninguém sai: Nada é pior do que ser abandonado dentro de uma área de quarentena. Muralhas medievais podem ser perfeitas para isso. Imagine a Porto Real de Game of Thrones isolada pelo miserável do Rei Joffrey, com guardas Lanninster trucidando quem tentar sair e multidões de zumbis soltas pelas ruas, e ate o Montanha entraria em pânico.

Levante os mortos: é bem provável que existam tantas pessoas mortas e enterradas do que vivas para serem transformadas de alguma forma. Fazendo com que todos ou uma parte dos cadáveres também integrem sua horda, os números da mesma logo podem chegar a patamares impressionantes.

Zumbifique o mundo em segundos: Faça com que no seu mundo os zumbis não sejam gerados por uma epidemia crescente, mas que o processo tenha sido instantâneo, e que apenas uns poucos seres humanos não tenham sido afetados (por um motivo ou outro). Digamos que os zumbis foram gerados pelo deus da morte, que conseguiu destruir os outros deuses em um único e decisivo golpe, fazendo dos pobres mortais canibais sem mente que vagam pelo mundo numa forma macabra de adoração. Isso eliminaria grande parte das dificuldades descritas no começo do post e faria milênios de civilização ir por agua abaixo em instantes.

Agente transmissor: uma opção é criar uma maneira de espalhar o vírus (ou maldição, ou seja lá o que você inventar) de uma maneira que não dependa do contato entre humanos, mas que tenha fácil acesso a eles.  Podem ser mosquitos, uma chuva contaminada ou a execução de algum ato específico (como fazer o sinal da cruz ou outro gesto de proteção, pelo qual o mortal seria castigado pelos demônios). Duas coisas são importantes neste caso: manter o risco de contaminação ao ser ferido pelos mortos-vivos (sob o risco de perder um dos maiores fatores de medo do gênero) e permitir que grupos de sobreviventes se protejam da “contaminação” de alguma forma.

Magia restrita: os poderes de um mago podem facilmente anular o terror de se perseguido por uma horda de inimigos famintos. A capacidade de voar, de abrir buracos em pedra sólida, de se comunicar a distancia e (óbvio) de trucidar dezenas de inimigos com uma bola de fogo podem levar seus jogadores a rirem de seu bandinho de cadáveres. Prefira cenários com pouca ou nenhuma magia, ou pense em criar regras que façam o uso de poderes ser custoso para o jogador. Os zumbis podem ser atraídos por manifestações mágicas, por exemplo. Matar uns poucos inimigos poderia lhe fazer o alvo de milhares.

Limite às habilidades dos sobreviventes: se os camponeses medievais são quase auto suficientes, então não deixe os personagens serem camponeses, oras! De novo, use cidades: ali é muito mais fácil encontrar gente que depende dos outros para viver. Se usar a dica acima, faça com que os salvos ocupem um nicho específico da sociedade. Por exemplo, faça com que apenas o ardiloso deus dos ladrões tenha conseguido fugir do ataque do deus da Morte. Assim os únicos sobreviventes foram os “abençoados”: vigaristas, assaltantes, assassinos e ladinos em geral. Antigas gangues de rua virariam bandos errantes e guildas de malandros dominariam refúgios lotados de armadilhas. Mas quem plantaria comida, forjaria o aço e costuraria roupa? Eles teriam que continuar roubando os pertences da velha civilização, e é exatamente o que queremos: cenas de assalto a despensas de tavernas infestadas e momentos tensos por que os virotes acabaram.  Ir para as montanhas seria morrer de fome!

Conhecimento restrito: No mundo moderno, se eu não sei algo eu leio um livro ou procuro na internet. No mundo medieval poucos possuem acesso ao escasso conhecimento, imagine então em um apocalipse zumbi? A busca por uma informação específica, como consertar um moinho de água ou um mapa para os calabouços protegidos (?) do castelo do conde pode levar a uma caçada interminável por um documento ou pessoa. A explicação para o que aconteceu com o mundo também é uma grande motivação. Use e abuse de lendas, profecias e superstições. Faça os zumbis terem poderes diferentes do que seus jogadores esperariam, ou melhor ainda, engane-os e faça-os achar isso sem ser verdade. Um zumbi entra em um refugio mega seguro por uma passagem desconhecida: eles atravessam paredes. Um morto vivo esta em cima de uma árvore: eles sabem escalar.  Deixe-os procurar conhecimento, mas nunca permita que fiquem confortáveis e achem uma informação recém-descoberta 100% confiável.

Bom, é isso. Se você já tiver criado um cenário assim, ou pensou em alguma dica para que eles fiquem mais legais, por favor comente abaixo! Abraço a todos! 

3 comentários:

  1. Bem legal a postagem, Heitor. Realmente, em um mundo de fantasia medieval o Apocalipse zumbi seria bem diferente. Já chegou a dar uma olhada naquele Dungeons & Zombies?

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    1. Não, não conhecia, cara. Dei uma olhada aqui e parece que encaixa exatamente com o post :) Mas tive a impressão que ele cria várias sociedades pós apocalípticas em mundos com zumbis, ao invés de focar no apocalipse em si. confere?

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  2. Como eu disse no face, poderia até aproveitar a bagaça pra fazer um levante de Revenants (Essa sim é uma espécie de morto vivo FODA), uma coisa tipo Scorpion ou então SCP-049...

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